sexta-feira, 30 de outubro de 2009

"Sobrou só esse nó no peito, agora faço o quê?"

Não sabia ao certo se era a decadência que a incomodava. Ou o pedantismo, ou a mistura destes dois mais a total falta de amor. Desamor, ela dizia. E olhava o café frio como se buscasse alguma pergunta mais fácil de responder. "Sempre tive medo da decadência, de ficar obsoleta e velha demais, sem amor nenhum, fria mesmo. Sempre pensei demais". Claro, em alguma coisa a culpa devia instalar-se, mesmo que erroneamente. Então que a culpa fosse do seu racionalismo, da mania de calcular e pensar cada milímetro de cada passo a ser dado em um futuro qualquer. Que a culpa fosse dos livros que pendiam de sua prateleira e de sua imaginação, dos discos que ecoavam em sua cabeça e de seu lirismo barato, o mesmo, de sempre.
Nada acontecia há muito tempo. Eram ausências enormes, lacunas cada vez maiores, mais vazias e que gritavam por um pouco de atenção e qualquer coisa que não o silêncio. Sem falar nas tentativas, parcas e fracassadas. Ela gostava de pensar, por puro romantismo, que o silêncio era só consequência de todo aquele desamor. Dizia para si mesma que não tinha esperanças, mesmo sabendo que essa mentira de fora-para-dentro nunca chegaria ao seu âmago e nunca seria sequer uma meia-verdade. Acreditava febrilmente em suas ilusões durante pelo menos alguns minutos, até o café esfriar e ela pedir outro e resolver que um doce cairia bem, talvez adoçar a vida, nem que fosse uma felicidade falsa, uma efêmera explosão de serotonina.
Mas acabou pedindo outro café, para rebater a frieza do anterior, e quem sabe a sua própria, sempre esperando por algo que nunca viria.

Um comentário:

Danilo Tavares disse...

café nem sempre é uma boa escolha, nem sempre.